A realização do julgamento na modalidade virtual, ainda que haja expressa e tempestiva oposição de parte no processo, não acarreta a sua nulidade

22/02/2023 às 10:12
Leia nesta página:

Imagine a seguinte situação hipotética:

O banco ajuizou ação de cobrança contra João. O pedido foi julgado procedente e transitou em julgado.

O banco ingressou, então, com cumprimento de sentença cobrando a quantia devida.

O juiz determinou a penhora de valores que estavam na conta bancária de João.

O devedor interpôs agravo de instrumento sustentando que não poderia ter havido a penhora porque seriam verbas de natureza alimentar.

As partes foram intimadas para se manifestarem, no prazo de 15 dias, acerca de eventual oposição ao julgamento virtual do agravo de instrumento.

João, dentro do prazo assinalado, apresentou petição dizendo que se opunha ao julgamento virtual e que deseja que o julgamento fosse presencial.

Mesmo com a oposição, o Tribunal de Justiça julgou o recurso em sessão virtual e negou provimento ao agravo de instrumento.

João interpôs recurso especial alegando a nulidade do julgamento, por desrespeitar a manifesta oposição à forma de julgamento virtual.

 

O STJ deu provimento ao recurso de João? Houve nulidade?

NÃO.

Inicialmente, é importante assinalar que o julgamento virtual é uma forma de julgamento válida, conforme pacífica jurisprudência do STJ:

Não há que se falar em nulidade do julgamento virtual porque ele está em consonância com os princípios da colegialidade, da adequada duração do processo e do devido processo legal.

STJ. Corte Especial. AgRg no AgRg no RE nos EDcl na APn 327/RR, DJe 30/6/2020.

 

Para o STJ, a mera oposição da parte ao julgamento virtual não tem o condão de determinar (obrigar) a ocorrência do julgamento em sessão presencial ou telepresencial. Isso porque não há lei que imponha essa consequência.

Em sua redação originária, o art. 945, §§ 2º e 3º, do CPC/2015 previa o direito de as partes apresentarem discordância do julgamento por meio eletrônico, sem necessidade de motivação, “sendo apta a determinar o julgamento em sessão presencial”.

Ocorre que esses dispositivos foram revogados pela Lei nº 13.256/2016, ficando consignado no parecer da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania no respectivo Projeto de Lei (PL nº 2.384/2015), que a revogação ocorreu porque autorizava as partes, sem motivação, “solicitar julgamento presencial, mesmo quando não houver previsão de sustentação oral, o que pode ampliar sobremaneira o número de petições a serem analisadas pelos tribunais superiores, inviabilizando a Corte e o funcionamento do plenário virtual”.

Desse modo, como não há, no ordenamento jurídico vigente, o direito de exigir que o julgamento ocorra por meio de sessão presencial, o fato de o julgamento ter sido realizado de forma virtual, mesmo com a oposição expressa e tempestiva da parte, não é, por si só, causa de nulidade.

Destaca-se que a decretação de nulidade de atos processuais depende de efetiva demonstração de prejuízo da parte interessada (pas de nullité sans grief), por prevalência do princípio da instrumentalidade das formas.

Com efeito, a realização do julgamento por meio virtual, mesmo com a oposição pela parte, não acarreta, em regra, prejuízo nas hipóteses em que não há previsão legal ou regimental de sustentação oral, sendo imprescindível, para a decretação de eventual nulidade, a comprovação de efetivo prejuízo na situação.

Além disso, mesmo quando há o direito de sustentação oral, se o seu exercício for garantido e viabilizado na modalidade de julgamento virtual, não haverá qualquer prejuízo ou nulidade, ainda que a parte se oponha a essa forma de julgamento, porquanto o direito de sustentar oralmente as suas razões não significa o de, necessariamente, o fazer de forma presencial.

 

Em suma:

A realização do julgamento na modalidade virtual, ainda que haja expressa e tempestiva oposição de parte no processo, não acarreta a sua nulidade.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.995.565-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/11/2022 (Info 762).

 

DOD Plus – informações complementares

O requerimento para a não inclusão do recurso em plenário virtual deve ser fundamentado, não bastando a mera oposição sem indicação das razões que justifique o julgamento telepresencial.

STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 2.164.849/RS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 12/12/2022.

 

A pretensão de sustentar oralmente não é suficiente para impedir que o presente recurso seja incluído em pauta virtual (e-Julg), tendo em vista que o Superior Tribunal de Justiça implementou funcionalidade, na plataforma de julgamento virtual, para que os advogados, nos casos previstos em lei, possam enviar arquivos de áudio ou vídeo com suas sustentações orais.

Ademais, as partes podem também apresentar memoriais, por meio eletrônico ou mediante petição nos autos e, durante o julgamento eletrônico, todos os Ministros que compõem o Órgão Colegiado têm acesso ao conteúdo integral do voto do Relator e dos autos, e a sessão tem duração substancialmente maior que a do julgamento presencial, do que resulta um exame ainda mais acurado por seus Membros.

STJ. 4ª Turma. AgInt no REsp 1.814.753/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 12/12/2022.

Sobre o autor
Jades Oliveira e Oliveira

Bacharel em Direito, meu objetivo é magistratura federal, fui estagiário da Procuradoria Federal SC, de março de 2017 a fevereiro de 2019 e do PROCON Municipal de Jaraguá do Sul-SC, de fevereiro a junho de 2019.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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