A nulidade processual no interrogatório do réu: Análise da decisão do STJ no Tema Repetitivo 1.114.

30/09/2024 às 11:52
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Resumo:

Este artigo analisa a decisão da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o Tema Repetitivo 1.114, que aborda a nulidade decorrente da inversão da ordem do interrogatório do réu no processo penal. A decisão esclareceu que essa nulidade pode ser arguida até as alegações finais, conforme o artigo 571, incisos I e II, do Código de Processo Penal (CPP). O estudo investiga o impacto dessa interpretação no direito processual penal, comparando o entendimento fixado com a jurisprudência anterior, além de explorar os limites da arguição de nulidades e os princípios que garantem a ampla defesa e o devido processo legal.


Introdução:

A ordem dos atos processuais no direito penal é um dos pilares para garantir o devido processo legal e a ampla defesa. O interrogatório do réu, como último ato da fase de instrução, desempenha um papel essencial na preservação desses direitos, já que ele deve ocorrer após a oitiva das testemunhas e a produção de provas. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema Repetitivo 1.114, esclareceu os limites temporais para a arguição de nulidades relacionadas à inversão da ordem do interrogatório. Este artigo visa discutir essa decisão, suas implicações na prática processual e o equilíbrio entre formalismos procedimentais e a proteção dos direitos fundamentais.


Revisão de Literatura:

1. Ordem Processual e o Interrogatório do Réu Conforme expresso no artigo 400 do Código de Processo Penal (CPP), o interrogatório do réu deve ser o último ato da fase de instrução. Segundo Renato Brasileiro de Lima (2022), essa disposição visa garantir que o acusado seja ouvido em um momento em que já teve acesso a todas as provas contra si, podendo, assim, se defender de maneira mais completa.

2. Nulidades no Processo Penal O sistema de nulidades no CPP segue o princípio do prejuízo (pas de nullité sans grief), conforme preconizado por Ada Pellegrini Grinover (2011), garantindo que a nulidade só seja reconhecida quando houver efetivo prejuízo para a defesa. A doutrina também distingue entre nulidades absolutas e relativas, sendo as últimas aquelas que podem ser sanadas se não forem apontadas nos momentos processuais adequados. Nesse sentido, o artigo 571 do CPP prevê que as nulidades da fase de instrução devem ser suscitadas até as alegações finais.


Análise:

A Terceira Seção do STJ determinou que a nulidade decorrente da inversão da ordem do interrogatório pode ser arguida até as alegações finais, em conformidade com o artigo 571, I e II, do CPP. Isso corrigiu a interpretação de que a nulidade deveria ser suscitada imediatamente após a defesa perceber a inversão na ordem das oitivas. Essa interpretação reforça o entendimento de que o prazo para arguir nulidades deve respeitar o rito processual completo, preservando o direito à defesa ampla e efetiva.


Implicações Práticas:

A decisão do STJ, ao tratar da nulidade no interrogatório do réu, segue o princípio do devido processo legal, conforme previsto no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal. Ao permitir que a nulidade seja arguida até as alegações finais, o tribunal evita formalismos que poderiam comprometer a defesa do réu. De acordo com Eugênio Pacelli (2020), o interrogatório é considerado o ápice da defesa pessoal do acusado, razão pela qual sua inversão injustificada afeta diretamente o exercício da ampla defesa.

A jurisprudência anterior do STJ, em decisões como o REsp 1.933759/PR e o REsp 1946472/PR, já apontava para a necessidade de flexibilizar prazos para a arguição de nulidades, especialmente quando há comprometimento de garantias constitucionais. O entendimento unificado no Tema 1.114 reforça essa linha de raciocínio, assegurando que a defesa possa apresentar suas contestações até a última oportunidade prevista no processo.


Conclusão:

A decisão da Terceira Seção do STJ sobre o Tema Repetitivo 1.114 reafirma a importância da ampla defesa no processo penal, ao permitir que a nulidade relativa à inversão da ordem do interrogatório seja arguida até as alegações finais. Isso contribui para a proteção dos direitos do acusado e para a preservação da integridade do devido processo legal, sem comprometer a celeridade processual. A decisão representa um avanço na jurisprudência penal brasileira, alinhando-se aos princípios constitucionais e aos entendimentos doutrinários predominantes sobre a matéria.


Referências:

BRASILEIRO, Renato de Lima. Manual de Processo Penal. 10ª ed. Salvador: Juspodivm, 2022.

GRINOVER, Ada Pellegrini. As Nulidades no Processo Penal. 12ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

PACELLI, Eugênio. Curso de Processo Penal. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2020.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941.

STF. ARE 1467860. Tema Repetitivo 1.114. Superior Tribunal de Justiça, 2024.

Sobre o autor
Rodrigo Teodoro da Silva

Atualmente é Procurador-Geral do Município de Santana da Vargem, onde atua há mais de 3,5 anos. Atua como advogado há 14 anos, com formação em Direito, possui experiência em diversas áreas, incluindo direito administrativo, fiscal e constitucional. Comprometido com a justiça e o bem-estar social, Rodrigo Teodoro da Silva se dedica à defesa dos interesses públicos e à promoção da legalidade na administração municipal. Sua abordagem ética e estratégica na solução de problemas jurídicos reflete seu comprometimento em contribuir para uma gestão pública mais transparente e eficiente.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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